Sempre que novas perspectivas atingirem à mudanças no sistema carcerário, tenha uma pulga atrás da sua orelha. É o que vamos ver nessa pequena investigação, antes, pra não perder o costume, um trecho do livro O ESPIRATA:
Sem falar nos novos bilionários brasileiros que lucram em cima da ignorância do povo e das brechas que as leis e códigos penais oferecem,o mesmo dono da wizard por exemplo,que comprou a empresa de alimentos organicos é hoje quem lucrou com a fabricação do medicamento do tratamento precoce que nunca existiu, gravou um vídeo rindo com o lucro que estaria sendo feito para garantir o funcionamento de sua empresa e ações que pipocaram no mercado financeiro. O black mirror brasileiro está em curso e com força total. Detentos, enquanto escrevo, são forçados a pedalar para gerar energia em alguns presídios federais. Sob o pretexto de terem suas penas reduzidas em um dia a cada 16 horas, alguns com certeza serão torturados nesses equipamentos.
Aqui já vemos a nova modalidade de tortura defendida até por coletivos de sustentabilidade. Os relatos que chegam de tortura na papuda não param, independente do motivo, tudo é válido para os carcerários encontrarem prazer em destruir as mentes dos que já se encontram em condições desumanas nos depósitos de pessoas presas.
Mas nada chega aos pés do que um projeto de lei em Massachusets, planeja fazer.
Que os presos doem seus órgãos para conseguir a liberdade.
E eu pensei que o black mirror brasileiro era o pior, estava muito enganado.
Quanto vale um órgão humano? Tenho pensado nessa questão desde que soube de uma proposta de mudança preocupante na lei em Massachusetts (EUA), que permitiria que pessoas encarceradas trocassem suas partes do corpo por reduções em suas penas de prisão.
É isso mesmo. Os presos que doarem um dos seus órgãos ou a medula óssea podem ser recompensados com uma redução de 60 a 365 dias de sua pena se a lei for aprovada.
Segundo um dos responsáveis pela elaboração do projeto de lei, um dos benefícios é que ele aumentará o conjunto de potenciais doadores de órgãos. É verdade que há uma enorme escassez. Só nos EUA, mais de 100.000 pessoas estão à espera de um transplante e 17 pessoas morrem na lista de espera todos os dias.
Contudo, leis como essa não são a forma certa de mudar isso. Vamos analisar os muitos problemas desse projeto de lei.
Se submeter a uma cirurgia ou a outros procedimentos dolorosos para doar um rim, lóbulo do fígado ou medula óssea para salvar a vida de outra pessoa é uma das coisas mais generosas e altruístas que qualquer um pode fazer.
Entretanto, tais procedimentos não são isentos de riscos. Por exemplo, qualquer tipo de cirurgia tem o potencial de danificar outros órgãos ou resultar em infecções. As pessoas que doam rins têm maior probabilidade de, um dia, precisar de diálise ou de receber um rim doado.
É essencial que os doadores vivos compreendam e aceitem estes riscos em sua totalidade para que a sua decisão de doar seja devidamente informada e livre. Será que uma pessoa sofrendo na prisão, e desesperada para sair, consegue dar o seu consentimento livre e consciente dos perigos?
“Esta lei está sendo divulgada como um incentivo”, afirma Jennifer Bell, bioeticista da Universidade de Toronto, Canadá. Mas, haveria algum grau de coerção envolvida? Por definição, coerção implicaria haver alguma ameaça de dano influenciando a decisão da pessoa. O projeto de lei não menciona isso. Todavia, passar um ano a mais na prisão pode ser prejudicial para algumas pessoas, sobretudo se houver risco de violência, surto de doença ou condições de calor excessivo.
As pessoas encarceradas também podem não conseguir fornecer um histórico médico completo e franco, algo fundamental para determinar se podem ser doadores adequados, adverte Peter Reese, nefrologista da Universidade da Pensilvânia (EUA) que avalia potenciais doadores de rins e que já trabalhou em uma prisão feminina.
Os médicos costumam perguntar aos possíveis doadores sobre sua saúde, bem-estar e capacidade de cuidar de si mesmos, bem como se fumam ou usam drogas recreativas. Tais fatores afetam não só a viabilidade dos seus órgãos para doação, mas também a probabilidade de se recuperarem bem do procedimento.
“Me preocupo de que uma pessoa presa pode não se sentir confortável em passar um histórico completo e transparente”, afirma Reese. “É difícil avaliar o estilo de vida de alguém que está encarcerado e não é livre de verdade para tomar decisões”.
O projeto de lei também possui outros problemas. Seu objetivo parece ser usar pessoas que estão na prisão para aumentar o número de doações de órgãos vivos. Sabemos muito bem que tais pessoas são um grupo vulnerável, muito mais propenso a ter nascido na pobreza ou a ter sofrido abusos na infância. Também sabemos que as minorias étnicas e raciais compõem a maioria das populações prisionais. Por exemplo, 30% dos presos nos EUA são hispânicos e 38% são negros.
“Poderia ser visto… como a extração de órgãos dos negros para dar a outras pessoas”, conclui Bell. “Como uma questão de exploração”.
O deputado estadual Carlos González, um dos responsáveis pelo projeto de lei, enviou uma declaração a Technology Review americana argumentando que “aumentar o conjunto de potenciais doadores é uma forma eficaz de aumentar a probabilidade de membros da família e amigos negros e latinos receberem tratamento capaz de salvar vidas”.
É verdade que as pessoas de minorias raciais e étnicas têm ainda mais dificuldade em obter os órgãos que precisam. Por exemplo, em 2020, o número de transplantes realizados em pessoas brancas foi de 47,6% da parcela que atualmente está aguardando. Entre os negros, esse número foi de apenas 27,7%. Contudo, existem outras formas de comunicar sobre a doação de órgãos para comunidades minoritárias e incentivar a tomada de decisões fundamentadas sobre o assunto. E elas não deveriam envolver a troca de órgãos pela liberdade.
O que nos remete ao primeiro ponto. Quanto valem os nossos órgãos e como essa decisão é tomada? Um rim vale um ano de liberdade? A medula óssea vale menos? “Como eles fazem esse cálculo?” Bell se pergunta. “Seria mesmo uma troca justa?”
Por sorte, mesmo que o projeto de lei seja aprovado, isso não significaria que tais transações aconteceriam. Cada doação de órgãos tem de ser aprovada por uma equipe médica e ética, que inclui uma pessoa cuja única função é defender o doador. Reese acredita que é improvável que todos se sintam confortáveis com esse tipo de permuta. E acho que é melhor que seja assim.